Ep. Especial – Rua 10 de JULHO
10 de julho de 2016. Portugal sagrou-se Campeão Europeu de Futebol. Houve uma promessa de criar uma rua com esse nome (“10 de JULHO”). Um ano depois, será que já existe?
Episódio Especial – Rua 10 de JULHO
|Produção e apresentação: Marco António
|Tema oficial: “Fado do Sonho“ – Pensão Flor
|Música adicional:Orquestra Popular de Paio Pires
Com base numa reportagem realizada para o site marcoantonio.pt em julho de 2016, este episódio especial de HISTÓRIAS DE PORTUGAL de Saudade e Outras Coisas recorda – um ano depois – o feito mais importante do futebol português em Seleções AA e vai em busca da resposta a uma questão que foi levantada nessa mesma reportagem: uma promessa feita pelo presidente da União de Freguesias de Pegões, António Miguéns. Um ano depois, a 10 de julho de 2017, fomos a Pegões saber se a promessa foi cumprida.
António Miguéns (julho de 2017)
Agradecimento à rádio Antena 1, da RTP, pela cedência de sons da transmissão da final do Campeonato da Europa de Futebol 2016, em Paris, França – com as vozes de Alexandre Afonso e Nuno Matos.
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«É FERIADO HOJE, C@%&#$%!»
(reportagem realizada em julho de 2016)
OK, Éder. Mas… é dia 10 ou 11 de julho? | Uma reportagem para perceber se o “decreto” do herói da final do Euro é mesmo para levar a sério no futuro.
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«É FERIADO HOJE, C@%&#$%!», foi o grito, a plenos pulmões, de Éder, às 16:47 da última segunda-feira, na Alameda D. Afonso Henriques. Fernando Santos estava ali mesmo ao lado e baixou-se em jeito de “Oh não…!” perante o palavrão que coroou a declaração do mais recente herói dos portugueses. Os colegas de equipa que, pelas imagens televisivas, já anteviam que aquela frase sairia da boca de Éder exatamente como veio a sair, esses, não evitaram a gargalhada coletiva. Mas a mais notória reação ao grito (chamemos-lhe triunfal) de Éder veio dos muitos e muitos milhares que se deslocaram à Alameda para festejar a conquista do troféu no Euro 2016. Um imenso “bruá” de êxtase e alegria tomou conta da multidão em delírio na festa do título inédito no futebol português, a primeira grande conquista internacional na história da Seleção Nacional AA de Portugal.
Mais discursos foram feitos naquele palco da Alameda – Fernando Santos discursou, Cristiano Ronaldo discursou, Nani e Renato Sanches até fizeram “beat box” e José Fonte cantou -, mas nada superou aquele grito. Foi como que o ponto mais alto das celebrações de 11 de julho, segundo Éder, o novo “feriado” português, muito embora, o golo histórico que marcou tenha acontecido às 22:19 do dia anterior, 10 de julho.
Na pacata Rua 10 de Julho, em Santa Iria de Azóia, porém, as palavras de Éder, nos festejos da Alameda, não colheram grande apoio. Os moradores do arruamento da vila do concelho de Loures (previamente chamado de Bairro da Covina – uma rua de casas geminadas e pequenos prédios destinados aos antigos funcionários daquele fábrica videira – e rebatizado com a data da nacionalização da empresa, em 1975) consideram que as palavras – e o palavrão – de Éder aconteceram no calor do momento. Até mesmo Fernando Branco, um reformado de 84 anos, residente na Rua 10 de Julho há mais de 40 e guineense tal como Éder, é dessa opinião. «Ele deve ter dito isso por emoção… mais nada», diz o reformado, entre risos, muito fortes, quando tomou conhecimento do vernáculo adicionado pelo avançado da Seleção no final. «Faz parte! Alegria de mais é assim (risos)!» . «O feriado, mesmo para ser feriado,», diz Fernando Branco, «devia ser no dia 10. Sempre no dia 10 e não dia 11. O que o Éder disse… aquilo é a alegria demasiada e mais nada, que lhe obrigou a dizer isso!». Minutos antes, o guineense recebera-nos com desconfiança, mas terminou a entrevista a dar fortes gargalhadas. O futebol tem, de facto, o poder de quebrar barreiras entre as pessoas.
Duas portas ao lado, Maria Alice Martins, 69 anos, não viu a final de Paris. «O meu marido gosta de ver os jogos sozinho. Eu também gosto de ver, mas se aquilo estiver assim… já muito mau… viro-lhe as costas, fico nervosa». Mas viu os festejos, logo a partir do golo no prolongamento. «Vim ver para a janela quando eles marcaram o golo! Andaram para aí, para trás e para a frente! (risos)» Quanto a um novo feriado nacional, também o quer a 10 de julho, mesmo contrariando Éder. «Não me importa! É a 10 de julho!» Foi pena que não quisesse ficar com a imagem registada em foto para esta reportagem, porque Maria Alice sorriu durante toda a entrevista, feliz pelo feito da Seleção e pelo facto de “bater certo” com o nome da rua onde, confessa, adora morar.
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Por fim, António Sousa, no Cartão de Cidadão com 77 anos (50 deles passados na Rua 10 de Julho) e na cabeça com um panamá bordado com uma bandeira portuguesa. Falou connosco enquanto preparava as brasas para um «bacalhauzito» que ia almoçar. Reformado e viúvo, António viu a final do Europeu sozinho, mas festejou tão ou mais intensamente do que o resto dos portugueses. «Fiz para ali um barulho, sozinho!… Estava sentado, até dei um pulo! Até ali…estava com pouca fé.», confessa. «Os franceses estavam só a dizer mal e eu estava com pouca fé, mas… calhou mesmo bem!» Do tal feriado “decretado” por Éder na Alameda, António Sousa até ficou desconfiado que o avançado estivesse a falar «de há um mês antes (o 10 de junho)», mas, esclarecida a diferença de 30 dias, lança a teoria sobre a razão que levou Éder a dizer o que disse no dia seguinte à conquista do título: «Ele disse aquilo a 11 porque (a final) foi de noite, já; já foi a acabar o dia.» Simples, não é?
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[Pode ver esta entrevista, em vídeo]
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Mais ou menos a 60 quilómetros da Rua 10 de Julho de Santa Iria de Azóia, fica a Rua Onze de Julho, em Pegões.
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O arruamento (sem saída) é pequeníssimo, não tem mais que um armazém, uma oficina e meia dúzia de casas de habitação. Foi, aliás, numa delas – a “Vivenda Zé” – que a Comissão Instaladora da Freguesia de Pegões funcionou a partir de 11 de julho de 1985, data em que a Assembleia da República aprovou a criação da freguesia (entretanto, já extinta para a criação da União das Freguesias de Pegões). Era, por isso, de esperar que o autarca da terra, António Miguens, defendesse que as palavras de Éder fossem para levar a sério e que o feriado a criar fosse a 11 de julho. Mas não. E até surpreendeu – já lá vamos. Quanto ao feriado, diz que abdica «completamente do bairrismo, porque foi o dia em que fomos Campeões Europeus foi no dia 10 e não no dia 11. O feriado deve ser no dia 10 de julho.» A surpresa, então, veio a seguir. Questionado se coloca a hipótese de criar uma rua “10 de Julho” na União das Freguesias de Pegões, o líder local não hesitou: «É a melhor homenagem que podemos prestar aos nossos Campeões Europeus, aos jogadores, a todo o staff técnico da Federação Portuguesa de Futebol, é atribuir, no futuro, uma rua com o 10 de julho. Na próxima reunião de Junta é uma proposta que eu vou levar ao executivo», revela António Miguéns. A proposta do Presidente da União das Freguesias de Pegões tem fortes possibilidades de agradar na região, até porque o pai de um dos novos Campeões da Europa, Cédric Soares, é funcionário da Câmara Municipal do Montijo, o concelho a que pertence a União de Freguesias de Pegões. A promessa de iniciar o processo fica registada e «vou cumprir essa promessa», garante o Presidente da União das Freguesias de Pegões.
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[Pode ver esta entrevista, em vídeo]
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Resta dizer que a discussão lançada pelo sonoro grito de Éder na Alameda – e por esta reportagem nesta página – não esquece que tanto 10 como 11 de julho já são, ambos, feriados. Não nacionais, é certo, mas municipais. E com bastante precedência em relação ao sucesso da Seleção no Euro 2016. 10 de julho é feriado municipal em Miranda do Douro e comemora a data da elevação a cidade… em 1545! Já o 11 de julho é feriado municipal em Arcos de Valdevez e Santo Tirso, honrando o padroeiro São Bento. E aí pode residir um problema para os defensores de um novo feriado nacional, dedicado à vitória de Portugal no Campeonato da Europa. A decisão – a ser tomada – será da responsabilidade da Assembleia da República, em São Bento. Se assim for, também o Parlamento poderá ficar dividido, entre lembrar a data – 10 de julho – da histórica final de Saint Denis e “puxar a brasa à sua sardinha”, associando o feriado a São Bento e aproveitando, para isso, a deixa dada por Éder quando, a 11 de julho, gritou:
«É FERIADO HOJE, C@%&#$%!»